Quem é Amida? Uma Visão Ocidental

Muitos perguntam, afinal o que ou quem é Buda Amida. Existem muitos textos que tentam explicar o mito de Amida ainda de uma maneira metafórica do jeito que ocidentais sem qualquer referência católico-cristã possam entender. Contudo existe uma torrente de iniciantes e muitos praticantes experientes que ainda não conseguem desassociar a figura de Buda Amida de um ser supremo, regulador ou dono das ações humanas.
Para compreendermos quem ou o que Buda Amida realmente é, temos que levar em conta alguns aspectos e posturas, como seguem. O Budismo Shin é uma tradição budista e segue os sutras budistas, portanto temos que partir do pressuposto que ele passa uma mensagem budista e cabe a nós entende-la. Shinran Shonin (fundador da escola budista Jodo Shinshu) não era nenhum maluco e portanto merece credibilidade. Não sendo Shiran um louco, lembro que ele baseou a doutrina da Terra Pura em ensinamentos de 7 Mestres (Shichi Kozo) renomados do Budismo e anteriores a ele: Nagarjuna (dito o “pai” do Mahayana e criador da filosofia Madhyamika), Vasubandhu (criador da filosofia Yogacara), T´an Luan (mestre chinês que compilou vários textos e sutras da Terra Pura), Tao Cho (popularizou a doutrina da Terra Pura na China), Ch´an Tao, Genshin e Honen (que foi o grande professor, mentor e inspirador de Shinran Shonin).
Também temos que a figura do Buda Amitabha e de Amithayus (Amida em japonês e Amito em chinês) é unânime em todas as linhagens budistas, incluindo o Zen, o Ch´an e as escolas tibetanas portanto o Budismo Terra Pura não apresenta nada de novo, nem estranho à doutrina budista em geral, aliás muito pelo contrário. A única tradição que não possui este conceito é a Theravada.
Lembremos que no oriente, o uso de metáforas, alegorias e mitos para se explicar conceitos, arquétipos e fundamentos é largamente utilizado. Um exemplo: Avalokitesvara (Kannon em japonês e Kwan Yin em chinês) é representado como uma figura humana, mas não há indícios históricos que comprovem que ele definitvametne existiu, ou seja, é um mito. E muitos budistas recitam “Om Mani Padme Hung” que é o mantra de Avalokitesvara, que nunca existiu… logo, isto tb não é considerado “anti-budismo”. Recitar um mantra não é confiar num “poder” que não é o seu?
Vamos também deixar dogmas e conceitos católico-cristãos de fora. Não dá para ficar comparando Budismo com Cristianismo, pois não dá para argumentar com dogmas e lembremos que Shakyamuni sempre utilizou métodos diferentes para explicar a mesma coisa para pessoas diferentes. Podemos dar uma explicação extremamente “técnica” sobre o assunto, mas querendo evitar tal prática, pretendemos tentar explicar de uma maneira mais coloquial, mais acessível a todos.Muito bem, isto posto e entendido vamos lá.É muito comum criarmos uma confusão mental quando tentamos entender um mito ou a personificação arquétipica tão comum na Índia e ocidente em geral, pois geralmente entramos em conflito com nossas bases católico-cristãs. Você se sente assim? Bem-vindo ao time! No começo, tudo geralmente é muito estranho, mas sempre temos que ter em mente que estamos numa escola budista, logo tudo tem que ter uma lógica clara…
O Buda Amida, como Buda primordial, é a fonte, a origem de todos os Budas, mitologicamente falando. Imagine uma fonte de água do tamanho de vários universos, a fonte é o Buda e a água é o composto de sabedoria e compaixão, luz e vida. Esta água transborda pela fonte e é infinita, formando “poças” pelo Universo em que nos encontramos e em nossa existencia atual. Cada vez que pisamos nestas “poças” entramos em contato com a “mente búdica”, a “mente pura” de Buda. Buda Amida é uma “entidade teológica personificada”, segundo Rev. Prof. Ricardo Mario Gonçalves. É uma representação da Iluminação em si. Mas de nenhuma forma é um ser, ou um regulador, ou um juiz, ou um criador. Em nada se assemelha ao deus cristão. Ele não é a origem de tudo, ele é a representação da origem da compaixão ilimitada, tanto que no mito de Avalokitesvara, este nasce de uma lágrima de Amithaba.
Troque Buda Amida por “Iluminação” ou “Natureza Búdica” e releia os textos que falam sobre Ele. Acho que fica mais fácil assim! E troque “Terra Pura” por “Nirvana”, vocês verão que as peças começam a se encaixar. E se você encontrar a palavras “Shinjin” (Mente Confiante) troque por “Mente Búdica” ou “Mente Pura”.
Muitos perguntam: Amida é uma figura a qual devo recorrer em momentos de necessidade? Olhem, na verdade, no momento de necessidade você só tem a si próprio e aos ensinamentos budistas. Não dá para recorrer a ninguém mais. Está conosco! Não podemos confundir com o deus cristão. O mito de Amida só pode nos oferecer o porto seguro do Dharma, mas ele não elimina karmas. Por favor, leiam o texto OCEANO que está aqui no blog . Acho que vão entender o que queremos dizer. Buda Amida não controla nada no Universo. Ele não existe como pensamos que existe! É uma metáfora! Uma metáfora, não pode controlar o mundo e não há divindade no Buda Amida, podemos rezar para ele o quanto quisermos e pedir para ele nos iluminar, mas não vai dar resultado.
Mas como não podemos nos iluminar sozinhos? Perguntariam alguns. Quando falamos em “poder próprio” estamos dizendo que se você senta para meditar, por exemplo, com o intuito de se iluminar você nunca vai conseguir isso, por que quem está no comando é o seu EGO e toda a filosofia budista está calcada na eliminação deste. Como você vai se iluminar através de algo que você tem que eliminar? Leiam o texto OCEANO que é um texto que ilustra bem isso. E, olhem, isto não é exclusividade da Escola da Terra Pura no Budismo, não! Agora se você se senta com a mente limpa, sem pretensões, sem objetivos, apenas confiante que você pode chegar lá e tem a consciência de que para chegar lá você tem que se distanciar cada vez mais de seu objetivo, mas sempre confiando que isso é possível porque várias pessoas já conseguiram desta forma, você chega! O próprio “querer se iluminar” é uma manifestação egóica, a Iluminação é uma consequência, não um objetivo e sendo uma consequência, não depende de você. Agora se passamos a ter a confiança (erroneamente traduzido por “fé”) – SHINJIN – passamos a ver o mundo sem julgamento, ver o mundo com a MENTE BUDICA, e ver o mundo desta maneira, é ver a realidade como ela realmente é. É pisar na poça de Amida! Tanto que Shinran fala que basta recitar o nome de Buda Amida uma única vez, desde que que feito com a mente pura, mente búdica, mente confiante, Shinjin e estamos garantidos!
Agora isso não é exclusividade nossa [Budismo Shin], olhem as thangkas (pinturas sagradas) tibetanas, na sua grande maioria Amitabha está lá. No Zen e no Ch´an é a figura central nos altares. Por que? Porquê todas as escolas tem este conceito, só que poucas dão nomes “aos bois” e centram seu ensinamento nisso de forma explícita. Peguemos o Ch´an como exemplo, praticam meditação, mas cumprimente um praticante Ch´an, para ver. Em vez de “Olá”, ele vai te dizer “AMITOFO” que é “Buda Amida” em chines!
Se estamos todos interligados (fenômeno da interdependência) e todas as nossas ações são refletidas no universo, temos que nos integrar a isso, eliminando nossa mente dualizada (você já deve ter ouvido isso largamente pelos ensinamentos budistas) estamos eliminando o “NOSSO PODER”, o Poder Próprio, Jiriki e dando lugar, ao PODER DO OUTRO, ou o poder unificado, Tariki.. De uma maneira simples, o “Outro Poder” é a ausência do EGO!
Então não podemos contar consigo mesmo? Não! Você deve contar com você próprio para alterar sua visão do mundo. Todo o caminho começa com o nosso próprio poder, nosso ego, nossa vontade e depois vemos que ele não é suficiente, pois nosso EGO é nosso maior obstáculo. Troque “Outro Poder” por “Ausência de Ego” e veja o significado.
Várias pessoas acreditam que no budismo só podem contar consigo, que esse é o valor central do Budismo e que não devemos depender de um deus com o qual tenho que barganhar. Mas, como vamos barganhar com Buda Amida? Barganhar com alguém que não existe? Vai barganhar o que? Oferendas? Para quem? Mas, mesmo assim “devo me sentir dependente de um buda de luz infinita”? Não, não é dependência. É compreensão e garantia. Compreensão de que temos um EGO e garantia que podemos subjugá-lo e quando falo que não podemos nos iluminar sozinhos, quero dizer pelo nosso próprio esforço. Porque pessoas que sentam para meditar durante décadas não chegam a lugar algum? Buda só meditou 49 dias! Tem gente que medita por 25 anos e não sai do lugar. Por que? Por que fazem errado? Mas as regras da meditação são simples e claras, não tem erro. Quantas pessoas meditam no mundo todo? Há quanto tempo? E por que não teve nenhum Buda entre nós nos últimos 2000 anos? A meditação é um caminho tão válido quanto o Nembutsu (recomendo a leitura do livro “Budismo Essencial de Gyomay Kubose para maiores comparações), pois da mesma forma que muitos meditadores devotados aos seus atos não se iluminaram nos últimos séculos, tantos outros grandes recitadores do Nembutsu, também não lograram èxito! Por quê? Pq simplesmente é muito difícil se iluminar por conta própria, com todo a carga egóica que temos. Nossa mente é como um macaco pulando de árvore em árvore, estamos sempre julgando os outros e a nós mesmos, não conseguimos ver as coisas como são.

Não temos Mente Búdica!

O mito de Amida nos ajuda a compreender um conceito extremamente amplo e primordial, que se mostra de difícil absorção para os ocidentais, levando em consideração nosso passado arraigado aos dogmas cristãos e a visão judaico-cristã de um demiurgo que regula, julga e determina o futuro. Buda Amida não se apresenta nestas condições, nem com este papéis, é a simples “materialização” da origem de toda a sabedoria e compaixão existentes.

Namo Amida Butsu!