Budismo – Conceitos básicos

Shogyo Gustavo Pinto

 

Diante da variedade de Escolas em que veio a se diversificar o Budismo, nasce naturalmente a indagação quanto ao que têm em comum. Em outras palavras, quais os conceitos básicos do Budismo, aceitos por todas as suas diferentes Escolas?

Uma das noções centrais no primeiro Sermão  do Buda Sakyamuni, proferido em Benares, é a impermanência de todos os fenômenos (Annicca). Tudo é transitório, nada permanece o mesmo. O mundo não é composto de entes mas arde num contínuo processo de vir-a-ser. O gerúndio é o tempo do verbo “realidade”(Tathatha). O substantivo resulta de uma ilusão e expressa uma inútil aspiração irrealizável. E o que passa no fluir deste verbo, não tem forma, é um misterioso e insondável vazio (Sunyata).

Resistindo a este fluir, o apego (Trishna) espraia sofrimento (Dukkha) por toda parte, torna fadada à dor nossa existência. Queremos ficar e nos vemos partindo. Desejamos que perdurem mas insistem em nos deixar, os que amamos, sejam pessoas, lugares ou condições. Por fim, debalde tentamos ainda nos aferrar a esta existência, quando vemos que somos nós mesmos que partimos. A transitoriedade estilhaça ao fim a derradeira ilusão de continuidade. “Sofremos por estar com o que não desejamos, sofremos por não estar com o que desejamos” diz o mesmo Sermão. De uma coisa e de outra não conseguimos escapar, sejamos eruditos ou incultos, abastados ou carentes, crentes ou ateus, fosse ontem ou seja hoje.  A dor é universal. E nos aflige agora tal como quando primeiro pregou o Buda.

O sofrimento decorre do apego nos manter prisioneiros da suposição de um Eu. Supondo que o somos, nos persegue implacável frustração. Sonhamos que no Eu permanecemos sendo quem eramos mas quando sobre ele nos voltamos, o descobrimos transformado pelo tempo e suas experiências. Sempre outra vez se desvanece quem cremos ser e o que imaginávamos que tudo fosse. De uma para outra imagem vai vagando, fugindo e buscando a si o que não é, girando no círculo vicioso de nascimento e morte (Samsara).

Para o Budismo este é um sonho malfadado, uma ilusão inútil e problemática. Ninguém há em nós que permaneça sendo quem foi (Anatta). Portanto, quando há sofrimento, ninguém há para quem este sofrimento seja um problema. E porque um só e mesmo vazio constitui tudo e todos, ilusória também é a separação que a suposição do Eu sugere entre si e um outro imaginário.

Por isso a compaixão (Karuna) é irmã da sabedoria (Prajna). O que sucede a um, a todos diz respeito. O Eterno vazio se desvela fundo único sobre o qual se movem as fantasmagóricas aparências. Quando a opacidade dessas figuras vãs se desvanece, soprada pela sabedoria Búdica, seus rostos se transfiguram no brilho de um sereno sorriso, representado na iconografia Budista pela face dos Budas. Neste semblante se prenuncia a Suprema Iluminação (Mahabodhi), quando ninguém mais há que sofra ou cause sofrimento, que tenha conflitos ou que os gere, que possa ser agredido ou agrida. O pesadelo finda na Luz e cede lugar à Paz, à Plenitude (Sukkha), à compaixão amorosa para com tudo o de que não mais nos imaginamos separados. Com a descoberta do caráter ilusório do Eu nasce o anseio de que se libertem todos os seres (Boddhisattva). Ao mundo dos Budas (Nirvana) todos são destinados. Enquanto restar uma ilusão, estaremos junto com a sua vítima. E haveremos de alcançar o Nirvana quando o último de nós enfim despertar. Se era universal a dor, universal há de ser a libertação. “Maravilha das maravilhas, todos os seres são Budas” afirmou o Buda Sakyamuni após a Iluminação. Que esta consciência possa florescer logo em todos, é o comum ideal de todas as Escolas Budistas. Em prol desta realização todas envidam os seus melhores esforços. Cada uma traz aos seus seguidores bem como a quem quer que sobre ela se debruce, uma inestimável contribuição, que tanto manifesta a Sabedoria Búdica quanto transmite também o fruto das vivencias e descobertas teóricas  dos grandes personagens que construíram a tradição de que são herdeiras. Assim como rios seguindo cursos distintos deságuam todos no mar, assim como as diferentes veredas que sobem a montanha convergem no cume, assim também estas Escolas compartilham uma unidade na diversidade, exemplificada pelo tríplice refúgio evocado nos Ritos Budistas: das trevas da errância nos abriga o Buda, da perplexidade atônita nos abrigam os Ensinamentos, da solidão isolada nos abriga a descoberta fraterna da unidade de todos os seres.

 

Buddham Saranam Gachami

Encontro refúgio no Buda

 

Dhamman Saranam Gachami

 Encontro refúgio no Ensinamento

 

Sangham Saranam Gachami

Encontro refúgio na Comunidade